Depois que líderes internacionais lamentaram a reconversão de Santa Sofia em mesquita em 24 de julho, na sexta-feira passada o presidente da Turquia publicou um decreto ordenando que outra emblemática e antiga igreja ortodoxa bizantina deixasse de ser um museu e servisse novamente ao culto muçulmano.
Em 21 de agosto, foi publicado no jornal oficial nacional um decreto do presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, ordenando que a antiga igreja ortodoxa e agora museu Kariye Camii ou Igreja de São Salvador de Cora, fossem convertidos em mesquita.
Este edifício está localizado em Edirnekapi, Fatih, o bairro mais populoso, religioso e conservador da capital Istambul.
Segundo informou AsiaNews, o decreto é baseado na decisão do Conselho de Estado de novembro de 2019 que indica que o uso do prédio como museu é “contrário à lei”. Agora, o antigo mosteiro ficará sob o controle da Diretoria de Assuntos Religiosos (Diyanet), encarregada de liderar as obras para transformá-lo em mesquita.
O Mosteiro de São Salvador de Cora é considerado pelo renomado historiador turco Ilber Ortayli como “um ponto de referência da herança cultural mundial” e “um dos exemplos mais raros da arte bizantina” devido aos seus mosaicos e afrescos, assinalou Asia News.
Segundo Asia News, essa conversão em mesquita é considerada “um insulto ao patrimônio cultural da humanidade, ainda maior do que o sofrido por Santa Sofia”. Do mesmo modo, destacou que alguns diplomatas acreditam que a decisão reflete a “ambição arrogante” de Erdogan, que mistura convicções políticas, ideologias e cultura.
Da mesma forma, assinalou que os críticos afirmam que a decisão é amplamente tolerada pelos políticos do ocidente “mais dedicados a garantir seus interesses econômicos e financeiros do que a defender a dignidade da pessoa humana”.
A esse respeito, informou que cerca de seis mil indústrias alemãs operam na Turquia e que o presidente Erdogan tem a aprovação de Donald Trump, que elogia sua “liderança”.
O Mosteiro de São Salvador foi construído em 534, durante o período bizantino. Suas paredes internas, assim como as colunas e cúpulas, são totalmente forradas com esplêndidos mosaicos e afrescos do século XI.
Após a conquista de Constantinopla pelo Império Otomano, o mosteiro foi transformado em 1511 em uma mesquita de forma muito semelhante ao que aconteceu com Santa Sofia. Portanto, parte de sua infraestrutura foi revestida com gesso. Anos depois, em 1945, o Conselho de Ministros da República da Turquia transformou a mesquita em um museu.
Em 1958, uma parte de seus afrescos e mosaicos puderam ser vistos após um cuidadoso trabalho da escola de arqueologia dos Estados Unidos, que contou com a colaboração de alguns especialistas turcos.
Em maio de 2020, o Conselho de Estado aprovou que o presidente turco convertesse o museu Santa Sofia em mesquita, decisão que foi lamentada pela Igreja Católica e que suscitou críticas internacionais pelos danos causados à história e ao patrimônio cultural da humanidade.
Os bispos dos Estados Unidos declararam 24 de julho como “dia de luto”, data em que foi realizada a primeira oração islâmica em 86 anos na antiga igreja de Santa Sofia.
A Arquidiocese Greco-Ortodoxa da América aderiu a este gesto simbólico e assinalou que a reconversão de Santa Sofia é “um programa de uma errada apropriação cultural e espiritual, assim como uma violação de todos os padrões de harmonia religiosa e respeito mútuo”.
Em 12 de julho, o Papa Francisco disse que se sentiu “muito triste” com a conversão de Santa Sofia.
Para a Igreja Ortodoxa Grega, cuja sede fica em Constantinopla, o uso de Santa Sofia como “troféu e símbolo de conquista” gera “fortes protestos e frustrações entre os cristãos em todo o mundo, além de causar danos à Turquia de várias maneiras”. A Igreja do Oriente Médio considera que a decisão de Erdogan ataca a liberdade religiosa, devido ao simbolismo representado por Santa Sofia.
Para os intelectuais turcos muçulmanos, seguidores da corrente reformista islâmica kemalista, Nazif Ay, Mehmet Ali Öz e Yusuf Dülger, a conversão de Santa Sofia representa “um erro grave e irresponsável” que elimina a neutralidade religiosa e dará lugar “ao ódio contra o Islamismo”.
Mohamed Abdel Salam, secretário-geral do Alto Comitê para a Fraternidade Humana e conselheiro especial do grão-imã de Al Azhar, Ahmed Al Tayeb, a mais alta autoridade dentro do Islã sunita, enviou uma carta a Erdogan exigindo que Santa Sofia continuasse sendo o local de abertura, encontro e inspiração para pessoas de todas as nações e religiões.
Fonte: acidigital