Em sua mensagem para o 7° Dia Mundial dos Pobres, Francisco exorta a não desviar o olhar de quem está em dificuldade, como as crianças que vivem em zonas de guerra, os que não conseguem sobreviver, os que são explorados no trabalho e os jovens prisioneiros de uma cultura que o faz sentir falidos.
Foi divulgada, nesta terça-feira (13/06), a mensagem do Papa Francisco para o 7° Dia Mundial dos Pobres que será celebrado, em 19 de novembro próximo, 33° Domingo do Tempo Comum.
O Pontífice recorda que “O Dia Mundial dos Pobres, sinal fecundo da misericórdia do Pai”, é “uma ocorrência que se está arraigando progressivamente na pastoral da Igreja, fazendo-a descobrir cada vez mais o conteúdo central do Evangelho”.
«Nunca afastes de algum pobre o teu olhar» é o tema do Dia Mundial dos Pobres, deste ano, extraído do Capítulo 4, 7 do Livro de Tobias.
Segundo o Papa, “está recomendação nos ajuda a compreender a essência do nosso testemunho”. “Deter-se no Livro de Tobias, eloquente e cheio de sabedoria, nos ajuda a penetrar melhor no conteúdo que o autor sagrado deseja transmitir”, escreve o Papa.
Sacudir de nós a indiferença
“Abre-se diante de nós uma cena de vida familiar: um pai, Tobit, despede-se do filho, Tobias, que está prestes a iniciar uma longa viagem. O velho Tobit teme não voltar a ver o filho e, por isso, deixa-lhe o seu «testamento espiritual». Foi deportado para Nínive e agora está cego; é, por conseguinte, duplamente pobre, mas sempre viveu com a certeza que o próprio nome exprime: «O Senhor foi o meu bem».”
“Tobit, no período da provação, descobre a própria pobreza, que o torna capaz de reconhecer os pobres. É fiel à Lei de Deus e observa os mandamentos, mas para ele isto não basta. A solicitude operosa para com os pobres torna-se-lhe possível, porque experimentou a pobreza na própria pele. Por isso, as palavras que dirige ao filho Tobias constituem a sua verdadeira herança: «Nunca afastes de algum pobre o teu olhar». Enfim, quando nos deparamos com um pobre, não podemos virar o olhar para o lado oposto, porque impediríamos a nós mesmos de encontrar o rosto do Senhor Jesus. Notemos bem aquela expressão «de algum pobre», de todo o pobre. Cada um deles é nosso próximo. Não importa a cor da pele, a condição social, a proveniência. Se sou pobre, posso reconhecer de verdade quem é o irmão que precisa de mim. Somos chamados a ir ao encontro de todo o pobre e de todo o tipo de pobreza, sacudindo de nós mesmos a indiferença e a naturalidade com que defendemos um bem-estar ilusório”, escreve Francisco.
Envolver-se pessoalmente é a vocação de todo o cristão
Segundo o Papa, “vivemos um momento histórico que não favorece a atenção aos mais pobres. O volume sonoro do apelo ao bem-estar é cada vez mais alto, enquanto se põe o silenciador relativamente às vozes de quem vive na pobreza. Tende-se a ignorar tudo o que não se enquadre nos modelos de vida pensados sobretudo para as gerações mais jovens, que são as mais frágeis perante a mudança cultural em andamento. Coloca-se entre parênteses aquilo que é desagradável e causa sofrimento, enquanto se exaltam as qualidades físicas como se fossem a meta principal a alcançar”.
De acordo com Francisco, “a realidade virtual sobrepõe-se à vida real, e acontece cada vez mais facilmente confundirem-se os dois mundos.
“Os pobres tornam-se imagens que até podem comover por alguns momentos, mas quando os encontramos em carne e osso pela estrada, sobrevêm o incômodo e a marginalização. A pressa, companheira diária da vida, impede de parar, socorrer e cuidar do outro. ”
A parábola do bom samaritano não é história do passado; desafia o presente de cada um de nós. Delegar a outros é fácil; oferecer dinheiro para que outros pratiquem a caridade é um gesto generoso; envolver-se pessoalmente é a vocação de todo o cristão”.
Dedicação aos pobres e excluídos
A seguir, o Pontífice recorda que “há tantos homens e mulheres que vivem a dedicação aos pobres e excluídos e a partilha com eles; pessoas de todas as idades e condições sociais que praticam a hospitalidade e se empenham junto daqueles que se encontram em situações de marginalização e sofrimento. Não são super-homens, mas «vizinhos de casa» que encontramos cada dia e que, no silêncio, se fazem pobres com os pobres. Não se limitam a dar qualquer coisa: escutam, dialogam, procuram compreender a situação e as suas causas, para dar conselhos adequados e indicações justas. Estão atentos tanto à necessidade material como à espiritual, ou seja, à promoção integral da pessoa. O Reino de Deus torna-se presente e visível neste serviço generoso e gratuito; é realmente como a semente que caiu na boa terra da vida destas pessoas, e dá fruto. A gratidão a tantos voluntários deve fazer-se oração para que o seu testemunho possa ser fecundo”.
Compromisso político e legislativo
O Papa ressalta a necessidade “de um sério e eficaz compromisso político e legislativo”. Segundo ele, “não obstante os limites e por vezes as lacunas da política para ver e servir o bem comum, possa desenvolver-se a solidariedade e a subsidiariedade de muitos cidadãos que acreditam no valor do compromisso voluntário de dedicação aos pobres. Isto, naturalmente sem deixar de estimular e fazer pressão para que as instituições públicas cumpram do melhor modo possível o seu dever. Mas não adianta ficar passivamente à espera de receber tudo «do alto». Quem vive em condição de pobreza, seja também envolvido e apoiado num processo de mudança e responsabilização”.
Pobreza e cenários de guerra
Francisco recorda na mensagem as novas formas de pobreza, pensando em particular “nas populações que vivem em cenários de guerra, especialmente nas crianças privadas de um presente sereno e de um futuro digno. Ninguém poderá jamais habituar-se a esta situação; mantenhamos viva toda a tentativa para que a paz se afirme como dom do Senhor Ressuscitado e fruto do compromisso com a justiça e o diálogo”.
Tratamento desumano reservado a muitos trabalhadores
O Pontífice lembra “as especulações, em vários setores, que levam a um aumento dramático dos preços, deixando muitas famílias numa indigência ainda maior”, “o tratamento desumano reservado a muitos trabalhadores e trabalhadoras; a remuneração não equivalente ao trabalho realizado; o flagelo da precariedade; as demasiadas vítimas de acidentes, devidos muitas vezes à mentalidade que privilegia o lucro imediato em detrimento da segurança”. Cita também “uma forma de mal-estar que aparece cada dia mais evidente e que atinge o mundo juvenil. Quantas vidas frustradas e até suicídios de jovens, iludidos por uma cultura que os leva a sentirem-se «inacabados» e «falidos».”
Agir com e pelos pobres
Segundo o Papa, “é fácil cair na retórica, quando se fala dos pobres. Tentação insidiosa é também parar nas estatísticas e nos números”.
“Os pobres são pessoas, têm rosto, uma história, coração e alma. São irmãos e irmãs com os seus valores e defeitos, como todos, e é importante estabelecer uma relação pessoal com cada um deles. ”
“O Livro de Tobias nos ensina a ser concretos no nosso agir com e pelos pobres. É uma questão de justiça que nos obriga a todos a procurar-nos e encontrar-nos reciprocamente, favorecendo a harmonia necessária para que uma comunidade se possa identificar como tal. Portanto, interessar-se pelos pobres não se esgota em esmolas apressadas; pede para restabelecer as justas relações interpessoais que foram afetadas pela pobreza. Assim «não afastar o olhar do pobre» leva a obter os benefícios da misericórdia, da caridade que dá sentido e valor a toda a vida cristã”, conclui Francisco.
Fonte: Vatican News